A desqualificação, também conhecida como discount ou “desconto”, é um processo marcante na comunicação entre indivíduos. No campo da Análise Transacional, ela se manifesta quando uma ou mais pessoas envolvidas em uma interação minimizam, ignoram ou negam algum aspecto essencial – seja um problema, uma emoção, uma competência pessoal ou mesmo a relevância de um fato. Esse fenômeno pode bloquear o crescimento pessoal e dificultar a busca por soluções efetivas nos relacionamentos. A seguir, serão apresentados os aspectos fundamentais desse conceito, com ênfase em sua origem, reconhecimento e superação.
Eric Berne, ao desenvolver a teoria da Análise Transacional (AT), dedicava atenção especial às mensagens não explícitas que circulariam nos grupos e nas relações íntimas. Na esteira dessas reflexões, autores posteriores, como Claude Steiner e Fanita English, aprofundaram o tema da desqualificação. Eles observaram que, muitas vezes, o desconforto psíquico não surge apenas de conflitos ostensivos, mas da negação ou relativização de elementos-chave na interação.
Steiner descreve como a desqualificação pode ser sutil. Ela não precisa assumir a forma de críticas declaradas ou mensagens agressivas. Um simples ato de não reconhecer a gravidade de um problema ou de tratar como irrelevante a fala de alguém pode ter igual ou maior impacto do que uma crítica explícita (STEINER, 1974).
A desqualificação ocorre quando uma pessoa, conscientemente ou não, deixa de validar a realidade de outra pessoa, de si mesma ou do contexto. Esse “desconto” incide em quatro possíveis dimensões:
Quando a desqualificação se estabelece em relações profissionais e familiares, torna-se um padrão de comunicação. Um colaborador que sempre recebe respostas evasivas a suas preocupações pode sentir-se desvalorizado e deixar de trazer inovações ou feedbacks importantes para a organização. Uma criança cujos pais minimizam seus medos pode desenvolver insegurança na vida adulta, pois teve seus sentimentos constantemente desqualificados.
Na Análise Transacional, cada pessoa carrega três Estados do Ego: Pai, Adulto e Criança. A desqualificação pode surgir de qualquer desses estados:
Apesar de a função do Adulto ser a de lidar objetivamente com a realidade, não é raro que ele exiba um viés de negação ou subavaliação, perpetuando a desqualificação em nível mais sutil. Esse tipo de dinâmica costuma mascarar problemas, atrasar soluções e afastar as pessoas do que elas, de fato, necessitam enxergar.
Essas situações podem sinalizar que a comunicação não está fluindo de forma saudável. O receio de enfrentar o desconforto ou a incerteza leva cada parte a “descontar” a possibilidade de diálogo genuíno.
Alguns estudiosos, como Mary e Robert Goulding, chegaram a propor uma escala de desqualificação, situando o fenômeno em níveis de severidade. Nos graus iniciais, a pessoa nega ou relativiza apenas aspectos pontuais. À medida que avança, pode concluir que é impossível mudar e que o problema não tem saída, fomentando pensamentos autodestrutivos e sentimentos de impotência (GOULDING; GOULDING, 1979). No topo dessa escala, a desqualificação extrema pode beirar a alienação da realidade, transformando-se em uma crença arraigada de “Nada funciona, não há nada a fazer.”
A desqualificação encontra raízes na história de cada pessoa, muitas vezes ligadas ao script de vida – o plano inconsciente que o indivíduo desenvolve desde a infância. Se, durante a formação, a criança não teve espaço para expressar medos, dores ou opiniões, ela aprende a negar ou a diminuir constantemente as próprias percepções. Ao longo do tempo, essas crenças instalam-se, e o adulto age de maneira automática (TAIBBI, 2014). Em vez de encarar situações com o olhar objetivo do estado de ego Adulto, recorre a estratégias de proteção desenvolvidas na infância ou reforçadas pela autoridade parental, perpetuando o ciclo vicioso do “desconto”.
Jogos Psicológicos, no contexto de Berne, envolvem trocas repetitivas que conduzem a resultados previsíveis e, em geral, desagradáveis. A desqualificação é um elemento comum nesses jogos, pois os papéis de Vítima, Perseguidor e Salvador podem se basear na negação de fatos ou necessidades reais (BERNE, 1964). Isso resulta na manutenção de relacionamentos disfuncionais.
Nas empresas, é essencial:
Reconhecer e superar a desqualificação é crucial para melhorar autoestima, comunicação e relacionamentos interpessoais. A Análise Transacional fornece ferramentas para romper esse ciclo negativo e fortalecer o estado de ego Adulto.